27 de agosto de 2012

As princesas não usam armas

0_braveSe ainda não foram ver a animação Brave - Indomável (ou Valente, na versão brasileira), aconselho. Bem como previno que o melhor será guardarem a leitura destas notas, se for o caso. Em todo o caso não vou falar nem da Pixar (que produz), nem da Disney (que distribui este filme) ou de análise mais profunda (e necessária) da indústria cultural. Ficarei por umas notas sobre o filme.

26 de agosto de 2012

A RTP e a economia portuguesa



 De forma genérica a economia portuguesa tem duas grandes características, é uma enorme fábrica de pobres, precários e desempregados e um excelente biótopo de grandes negócios. Mas vamos por partes na análise.

 Os últimos governos pouco se têm distinguido nas estratégias económicas estruturais, o favorecimento aos setores monopolistas tem vindo aliado a uma crescente deslaboralização do trabalho, colocando-lhe o ónus da competitividade. Favorecem-se os donos de Portugal, entregando-lhes os sectores estratégicos da economia nacional, geralmente isentos de risco, necessidade de investimentos arrojados e concorrência, concomitantemente reduzem-se os custos do trabalho, os direitos laborais e sociais e as obrigações do Estado no campo dos serviços públicos.

 Não é por obra do acaso que Portugal tem lugar no pódio europeu das assimetrias sociais e a burguesia mais lúmpen e rentista do velho continente. Se os grupos Sonae, Mello, Jerónimo Martins e Amorim projetam os seus proprietários para as listagens da Forbes, não foi de longe pela sua capacidade visionária ou pela mais-valia gerada através dos inovadores bens transacionáveis que produzem. Caso contrário, não seriam recetáculos de monopólios estatais privatizados, promotores de subemprego e os mais beneficiados com as sucessivas reformas do código do trabalho e com a impunidade fiscal. Os sucessivos governos de geometria variável ao centro têm sido os seus melhores procuradores, é preciso reconhecê-lo, era complicado demonstrar mais dedicação de classe.

 Mas o que tem tudo isto a ver com a RTP? 

Tudo. A privatização deste canal público é ilustrativa do funcionamento dos grandes negócios em Portugal. Tudo aponta para que a rifa da lotaria certa vá sair ao novo parceiro de eleição: o capital angolano. Mas, independentemente do comprador é já certo que usufruirá de todos os benefícios e garantias de sempre, foi isso que António Borges fez questão de frisar na sua entrevista à TVI.

 Vejamos, o governo pretende concessionar o canal público por um período entre 15 a 20 anos, abdica de qualquer encaixe financeiro e ainda lhe entrega a taxa de televisão – que todos nós pagamos mensalmente através da fatura de eletricidade – estimada em 140 milhões de euros ano. O consultor justifica a proposta por ela ser “uma hipótese muito atraente” e por permitir melhores condições de gestão da empresa. Borges tem razão, a proposta é olimpicamente atraente: a transferência de posse é gratuita, o adquirente recebe um imposto por inteiro e a garantia de lucros certos. É o sonho húmido de qualquer empresário.

 Ao mesmo tempo encerra a RTP2, acabando com cultura e a diversificação informativa e programática em canal aberto, Portugal passa a ser o único país europeu sem um serviço público de televisão, mas podemos ficar descansados, provavelmente continuaremos a ter direito ao “Preço Certo em Euros”.

 A economia pode estar em coma, o desemprego galopante, a precariedade como norma no mercado de trabalho, o saldo migratório próximo da realidade dos anos sessenta, mas o país continua a ser um éden para negociatas.

18 de agosto de 2012

Democracia, propriedade pública, emancipação

“Não há dúvida que a emancipação política representa um grande progresso. Embora não seja a última etapa da emancipação humana em geral, ela se caracteriza como a derradeira etapa da emancipação humana dentro do contexto do mundo atual. É óbvio que nos referimos à emancipação real, à emancipação prática.” (Karl Marx, 1843)

Emancipação política e emancipação humana


A propriedade pública é um elemento fundamental da política socialista. Sobre isto, proponho apenas umas notas, do abstrato ao concreto, da esfera jurídico-política para a económica. Marx apresentava a emancipação política como um grande progresso iniciado pelas revoluções burguesas. A desigualdade da sociedade de ordens herdeira do feudalismo foi abolida juridicamente com a afirmação da igualdade entre cidadãos. É claro que onde havia voto censitário se excluíam ainda os trabalhadores e durou muito até que as mulheres pudessem votar e alcançar a igualdade jurídica em vários aspetos.

[Artigo publicado em A Comuna nr. 28]
N' A Questão Judaica, Marx centra-se na emancipação política do judeu como uma emancipação incompleta, que resulta de uma “cisão do homem na vida pública e na vida privada”. Salientando “que a emancipação política não implica emancipação humana”. E fazendo notar as limitações da emancipação política: “[o] limite da emancipação política manifesta-se imediatamente no fato de que o Estado pode livrar-se de um limite sem que o homem dele se liberte realmente, no fato de que o Estado pode ser um Estado livre sem que o homem seja um homem livre”. Os direitos humanos são limitados aos direitos “do membro da sociedade burguesa”. Numa luta permanente encontram os seus limites nas fronteiras impostas pelos interesses do capital.
Em todo caso, conforme reproduzido acima, “[e]mbora não seja a última etapa da emancipação humana em geral, ela [emancipação política] se caracteriza como a derradeira etapa da emancipação humana dentro do contexto do mundo atual”.

A luta dos trabalhadores e das trabalhadoras

No caminho para a emancipação humana, a luta dos trabalhadores e das trabalhadoras desde o século XIX foi conquistando espaço na esfera jurídico-política.

5 de agosto de 2012

A "moda" do referendo?

Marcelo Rebelo de Sousa fez mais um comentário fantasticamente "democrático" na sua homilia desta noite: chamou "referendo opinativo" ao referendo local. É verdade que o referendo é tecnicamente não-vinculativo, mas a opinião não é de uns quaisquer, trata-se da opinião do povo, concretamente a opinião do povo da freguesia de Milheirós de Poiares acerca desta questão: "Concorda com a integração da freguesia de Milheirós de Poiares no concelho de S. João da Madeira?". Pergunta esta já aprovada pelo Tribunal Constitucional. Ora, em meu entender, tratando-se da opinião do povo sobre um assunto que lhe diz diretamente respeito, essa opinião não é só opinião: é vontade popular. Mas parece que a vontade popular é coisa que Marcelo e outros adeptos da extinção de freguesias não sabem respeitar. O vínculo maior não é o jurídico, é o político, o da legitimidade do povo de cada autarquia decidir sobre o seu futuro enquanto autarquia. Marcelo teme que "a moda pegue". Já viram se esta moda da democracia pega?