O PS revelou hoje que é à esquerda, enquanto
partido, um ator definitivamente ausente. Qualquer cidadão de esquerda,
independentemente da sua árvore genealógica, percebeu que a regra de ouro de
défice estrutural de 0,5% a ser inscrita numa lei para-constitucional, ou mesmo
na Constituição, é a tradução para a arquitetura jurídica portuguesa do
liberalismo extremado eterno e da austeridade permanente.
Não se pode defender retórica e esteticamente o
Serviço Nacional de Saúde, a Segurança-Social, a Escola Pública, em suma, o
Estado Social e depois promulgar o seu assassinato com o voto favorável ao
tratado europeu, imagine-se - depois deste teatrinho todo da adenda do
"crescimento económico" - com disciplina de voto. A lucidez da
discussão dos factos e dos efeitos atesta automaticamente a incoerência e a
mentira política. A troika e o Estado Social, pertencem à partida, a campos
radicalmente opostos, sem qualquer nexo ou fio de correlação possível.
Honestamente, não era de esperar outra coisa na
prática nem nos argumentos. O voto favorável dos "socialistas"
deve-se ao sentido de estado e à responsabilidade de defesa dos superiores
interesses da nação, quando a coisa chega a este ponto, entende-se que o PS não
tem um único argumento que fuja para lá da política austeritária, para defender
a sua posição política à esquerda. O interesse nacional é em todas as
circunstâncias, enquanto argumento, o mais barato, populista, demagógico e
vazio, e ao mesmo tempo, a última divisão da discussão política e
ideológica.
Não é de estranhar que se tenha ouvido por parte
de Francisco Assis e de Mota Amaral ataques viscerais às propostas da esquerda
parlamentar anti-troika, de abnegação total do papel da democracia enquanto
processo de decisão coletiva, criando uma narrativa que toda e qualquer
proposta plebiscitária ou de consulta popular é um entrave político, uma não
solução, uma reação conservadora. No passado, o argumento era parecido, mas
apesar de tudo diferente, recordo-me que o Tratado de Lisboa não foi
referendado porque o "povo não estava informado para o efeito". O
espírito desta ideia em toda a sua forma e conteúdo é profundamente
autoritária. Quando a democracia e o direito de participação pública cidadã são
uma barreira à condução da vida do país, sabe-se que a soberania popular é algo
que a elite portuguesa tem prazer em abdicar para conduzir seguramente o seu
programa de extorsão. Não fosse o povo votar mal.
A saída do troikismo cabe à união de todos que
se lhe opõem, o Partido Socialista relembrou hoje aos esquecidos que não está
nessa.
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