10 de março de 2011

da paciência do comum dos cidadãos, que também tem limites


“Há limites para os sacrifícios que se podem exigir ao comum dos cidadãos”

É a frase épica que hoje ecoa do discurso de tomada de posse de Cavaco Silva nas bocas da direita, de Passos Coelho a Paulo Portas. O que querem dizer exactamente com ela das duas uma, ou é um insulto ao tal comum dos cidadãos, ou então – o que é igualmente provável, porque nunca é de subvalorizar a estupidez humana – nem eles sabem bem ao certo.

A minha teoria é que alguém dos gabinetes de comunicação do PSD e do CDS percebeu com isto da Geração à Rasca que a formulação estilo “a-malta-está-farta” até funciona e mobiliza. Só que este “Há Limites” do trio Cavaco, Passos Coelho e Paulo Portas nunca pode aspirar a ser mais do que só um cover direitoso mau da “geração à rasca”, porque esquece um pormenor fundamental, a saber, aquilo de que “a malta” e o comum dos cidadãos estão fartos.

Ao mesmo tempo que o single “Há Limites” vai começando a tocar na comunicação social, a Visão de hoje dá conta do projecto que o PSD tem para respeitar esses limites aos sacrifícios que se podem exigir ao comum dos cidadãos.

Para Passos Coelho, o comum dos cidadãos deve, acima de tudo, ter menos protecção no emprego (vínculos e horários mais flexíveis e despedimentos mais baratos), menos protecção no desemprego (com menos prestações sociais e de acesso mais restrito) e menos rendimento disponível, não só porque se reduzem os pagamentos por trabalho aos fins-de-semana e feriados e, se precisarem muito, as empresas podem reduzir os salários durante alguns meses, como lhes der jeito, mas ainda porque saúde e educação devem ser privatizadas.

No manual Passos Coelho, o comum dos cidadãos, se por acaso tiver o azar de viver em certas zonas do país, pode não ter acesso a um posto de correio ou a um centro de saúde, por exemplo, e isto na melhor das hipóteses, porque até pode acontecer que a sua junta de freguesia seja extinta, porque a coesão territorial passa a ser decidida, não por requisitos igualitários decorrentes do contrato social democrático, mas por critérios economicistas num país-empresa. E também corre o risco de ter o seu distrito sub-representado no debate parlamentar, com a redução do número de deputados com que o manual Passos Coelho quer amputar a democracia para poupar uns trocos.

E a justiça que é oferecida pelo PSD ao comum dos cidadãos é uma mercadoria aviada por juízes mercenários que ganham tanto mais quanto mais depressa despacharem a coisa (e não é muito difícil imaginar de que forma é que isto vem agravar o já desigual acesso à justiça).

E há-de continuar a pagar os rombos financeiros abertos pelo sistema financeiro, quer suportando uma carga tributária sobre os seus rendimentos que continuará a ser desproporcionada face àquela que incide sobre este sector, quer sendo forçado a endividar-se junto deste em função do recuo do Estado Social na educação, saúde e segurança social.

Porque até pode haver limites para os sacrifícios que se podem exigir ao comum dos cidadãos mas, para a direita, apesar de tudo, eles são infinitamente mais elásticos do que os limites aos sacrifícios que se podem pedir ao capital.

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