O Público avança:
"A Alemanha lançou ontem a confusão entre os países da zona euro ao reabrir a discussão sobre o mega pacote de 750 mil milhões de euros aprovado na semana passada para ajudar os países em dificuldades financeiras e evitar a propagação da crise da dívida grega ao resto da eurolândia."
Mas de que lado está a Alemanha afinal?!
De cada vez que a Merkel se lembra de partilhar as suas dúvidas existenciais sobre o fundo europeu de estabilização (e não estou aqui a discutir as suas qualidades), os mercados ressentem-se, os especuladores perdem a confiança e exigem mais aos Estados.
De cada vez que a Alemanha manifesta o seu cepticismo relativamente à sobrevivência da União Monetária, ou à recuperação de países "periféricos", as yields (juros da divida pública) disparam, dificultando e encarecendo o financiamento dos Estados em crise.
A grande economia europeia exige agora, do alto da sua arrogância de potência, que o seu parlamento tenha uma palavra a dizer sobre a activação de garantias a prestar por este fundo (e respectivas condições de acesso). Teremos todos que seguir a cartilha germânica se queremos receber algum.
Vale a pena relembrar que:
1) Para este fundo ( 500 mil milhões de euros da zona euro e 250 mil milhões do FMI), contribuem todos os países da União Monetária;
2) Que não se trata aqui de um "bailout", de um salvamento a fundo perdido como foi feito com o sistema financeiro há um ano atrás. São empréstimos que serão devolvidos mais tarde pelos países. A única diferença é que serão concedidos a uma taxa razoável e não aos valores especulativos exigidos pelos mercados;
3) Que foi também a Alemanha, com a sua obsessão inflacionista e fiscal, que impediu a adopção atempada de medidas de auxilio aos países. A mesma Alemanha que pressiona o Banco Central Europeu no sentido da não emissão de divida europeia, que impôs as regas do Pacto de Estabilidade e Crescimento;
4) Que o modelo de crescimento alemão só foi possível à custa do endividamento e procura dos países que agora querem deixar cair. Os excedentes comerciais que lhes conferem a moral de rigor económico que agora querem impor são o resultado de estagnação interna dos niveis salariais, da procura, do crescimento e do consumo. A Alemanha é rica porque exporta, logo, para ser rica, alguém tem que ser pobre.
Para assumir o lugar que hoje ocupa, a Alemanha serviu-se das instituições europeias, que moldou segundo os seus interesses estratégicos, muitas vezes não coincidentes com os países periféricos, mais fragilizados do ponto de vista económico. O cenário actual não é excepção.
O que eu não percebo é por que é que, depois de tanto trabalho para construir uma UE à sua medida, a Alemanha esteja agora disponível para por todo o processo de construção europeia em causa.
De cada vez que a Merkel se lembra de partilhar as suas dúvidas existenciais sobre o fundo europeu de estabilização, ou a sobrevivência do euro, há, de facto, menos probabilidades de que o primeiro seja eficaz e o segundo consiga ultrapassar esta crise. São as profecias autorealizáveis dos mercados a funcionar.
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