Aproxima-se mais um período eleitoral na Ordem dos Advogados e, para além da "tareia" dada a Manuela Moura Guedes e de umas quantas aparições mediáticas, o legado do actual bastonário salda-se por uma (contra-) reforma no acesso à profissão de advogado: o exame de admissão àquela carreira.
Significa isto que, a acrescer à conclusão da licenciatura em direito (que pressupõe uma dedicação extrema durante 4 anos), o candidato/a tem agora de lograr a aprovação naquele exame de admissão para cumprir o objectivo de atingir a profissão de advogado.
Como seria de esperar, a oposição a esta medida não se fez tardar por parte dos estudantes, designadamente dos seus Núcleos. Importa, porém, conhecer que soluções defendem os detractores daquela medida tomada pela Ordem.
Não faço ideia se já algum Núcleo de Estudantes de Direito oficializou publicamente a tese, segundo a qual a melhor forma de racionalização do acesso à profissão de advogado (é este o fim daquele exame, segundo o Bastonário), é o de reduzir o número de vagas no acesso aos cursos de Direito.
Espero sinceramente não ver por aí alguém defender tal ideia, porque para além de incoerente, é simplista. Incoerente, pois não se pode ser contra a existência de limitações ao acesso à profissão de advogado e depois defender o aprofundar do Numerus Clausus, barrando a entrada a potenciais novos estudantes do Curso de Direito. Simplista, porque o problema antes de se colocar no número de licenciados excessivo, surge no número exagerado de faculdades de Direito, às quais a Ordem dos Advogados reconhece a licenciatura. Bem sei que posições políticas destas dos Núcleos permitiriam ganhar muitas eleições...
Ora, aqui assume particular relevância a qualidade do ensino prestada por muitas dessas faculdades, quase todas elas privadas. Bem sei o lobbies que elas representam e que custos teria uma eventual afronta...
A verdade é que, mais cedo ou mais tarde, os tribunais julgarão esta alteração (que chamar-lhe? estatutária?) ilegal. E aí teremos um de quatro caminhos a seguir pela Ordem:1- possibilitar o acesso a todos os licenciados, sem necessidade de exame de admissão; 2- Atribuir uma percentagem de importância àquele exame e outra ao mérito académico do estudante (alternativa bastante discutível se nos lembrarmos dos diferentes níveis de exigência nas múltiplas faculdades de Direito); 3- Exigir além da licenciatura, o Mestrado; 4- Transformar o Curso de Direito num Mestrado integrado, tal como se passa com outros cursos superiores.
A terceira e a quarta hipóteses, são de todas as mais preocupantes, pelo mesmo motivo. É que há aqui um cálculo financeiro relevante a fazer. Mil euros em propinas anuais durante a licenciatura, mais outro tipo de despesas (material escolar, alimentação, transportes, etc), mais dois mil e quinhentos euros em propinas de Mestrado. Tudo para que possam desempenhar a profissão que ambicionam.
Esta situação é tanto mais preocupante se nos lembrarmos que no período pré-Bolonha, um estudante que frequentasse o Curso de Direito em período idêntico (sensivelmente cinco anos) e o concluísse, pouparia imenso dinheiro em propinas (cinco anos a pagar mil euros em propinas, é bem diferente de 4anos a pagar os mesmo mil euros, mais um ano ou mais a pagar dois mil euros em propinas de Mestrado...).
Em todos os casos, arriscaria mesmo a dizer em quase todos os Cursos Superiores, um espectro impende sobre a cabeça dos Estudantes.
Aquando da entrada em vigor do Processo de Bolonha, os líderes estudantis não estiveram à altura dos seus postos. Engoliram rapidamente a retórica que lhes davam diariamente - menos anos a estudar, menos custos, formação ao longo da vida, internacionalização - e não foram capazes de entender o essencial. Os "filhos de Bolonha" acabarão as suas licenciaturas com um nível de conhecimentos muito inferior ao dos seus “pais”, serão em vocabulário neo-liberal muito menos competitivos... O caminho destes novos advogados será, pois, o mesmo que o dos pequenos artesãos medievais. Perderão parte da sua autonomia técnica (conhecimentos) e serão um brinde para os seus potenciais novos empregadores. O nível de exploração na carreira de advogados aumentará como nunca! Os que conseguirem encontrar emprego sentirão sempre no seu nariz o bafo de um novo e singular “exército industrial de reserva”. A precariedade na carreira de advogado será pois a regra.
Será este o tempo da proletarização das profissões liberais?
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